quarta-feira, 18 de maio de 2011




Fecham-se meus olhos perante a luz que me cega.
Venda-me os sonhos que eu cega hei de sonhar.
Porque tudo é o tudo que me convém ao nada do que sou.
E a mente, que nas sombras se envolve com a luz que me cega,
Sonha em ser o tudo do meu nada.
Hei então de querer, por saber tudo o que é possível nas palavras corridas do papel,
Um instante de paz e de triunfo por tudo aquilo que não fui,
Mas ainda hei de ser.

Se dissesse ao mundo todos os meus sonhos,
Diriam que não sou nada ao que cabe a eles ver.
O tudo da minha vida é deixar tudo pra trás,
Porque nada do que foi novamente será...
Cresce aos poucos o futuro do tudo que serei,
Desabrocham-se os sonhos do nada que não sou.
Sonhando hei de seguir rumo ao tudo que me espera.
Vagarosamente, lentamente...


Imagem: Autor Desconhecido
Texto: Giulia Perotti

domingo, 15 de maio de 2011

A espantosa realidade das coisas...




A espantosa realidade das coisas
É a minha descoberta de todos os dias.
Cada coisa é o que é,
E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra,
E quanto isso me basta.
Basta existir para se ser completo.

Tenho escrito bastantes poemas.
Hei de escrever muitos mais. Naturalmente.

Cada poema meu diz isto,
E todos os meus poemas são diferentes,
Porque cada coisa que há é uma maneira de dizer isto.

Às vezes ponho-me a olhar para uma pedra.
Não me ponho a pensar se ela sente.
Não me perco a chamar-lhe minha irmã.
Mas gosto dela por ela ser uma pedra,
Gosto dela porque ela não sente nada.
Gosto dela porque ela não tem parentesco nenhum comigo.

Outras vezes ouço passar o vento,
E acho que só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido.
Eu não sei o que é que os outros pensarão lendo isto;
Mas acho que isto deve estar bem porque o penso sem estorvo,
Nem idéia de outras pessoas a ouvir-me pensar;
Porque o penso sem pensamentos;
Porque o digo como as minhas palavras o dizem.

Uma vez chamaram-me poeta materialista,
E eu admirei-me, porque não julgava
Que se me pudesse chamar qualquer coisa.
Eu nem sequer sou poeta: vejo.
Se o que escrevo tem valor, não sou eu que o tenho;
O valor está ali, nos meus versos.
Tudo isso é absolutamente independente da minha vontade.


Texto: Alberto Caeiro
Imagem: Autor Desconhecido

quarta-feira, 20 de abril de 2011

No íntimo





"Desculpe-me amor, mas perdi a minha voz, minha alma, o meu ser.
De tanto a falar, não há nada a escrever...
O meu silêncio é o melhor a oferecer"


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Palavras mudas mancham o vazio,
Lágrimas de tinta evaporam-se na mente,
Mãos que dançam imóveis..

Enquanto vozes formam frases,
O pedaço de papel permanece só,
Branco... Pálido.

E, assim, conforme o tempo passa,
Sem se importar com os vultos ao redor,
O sentimento se desfaz;
A maré recua;
O coração sangra.


Imagem: Autor Desconhecido
Texto: Giulia Perotti